Home Notícias Termos reforçam preconceitos contra deficientes

Assessoria de Imprensa – 06/06/2007

Uma palavra pode ter inúmeros significados, o que sugere precisão no emprego de cada uma delas, seja na linguagem escrita ou na oral. Esse cuidado, no entanto, não é prioridade entre a sociedade brasileira, principalmente quando o assunto é deficiência. Os termos usados para denominar os deficientes, na maioria das vezes, são carregados de preconceito, reforçando as dificuldades de inclusão social que essas pessoas enfrentam no decorrer da vida.
O assunto foi tema da palestra da pedagoga Jussara Gonçalves do Carmo Berno na noite da última terça-feira, durante a II Jornada Pedagógica da FAAG. “A sociedade ainda não aprendeu a conviver com as diferenças, por isso age com preconceito contra os deficientes. O uso de termos inapropriados, como mongolóide, por exemplo, ainda é muito presente”, comenta. A professora, que é especialista em educação especial, concedeu entrevista à assessoria de imprensa da FAAG. Confira alguns trechos.

Quais são os termos mais preconceituosos contra o deficiente, usados atualmente?
Jussara: Na área da excepcionalidade, o termo surdo-mudo é bastante preconceituoso. Ele sugere que a pessoa não tem possibilidade de comunicação, o que não é verdade. Usando apenas o termo surdo consigo indicar que a pessoa tem déficit na área auditiva e não consegue falar. Quem é surdo tem todas as possibilidades de desenvolvimento oral, mas isso não acontece por conta do bloqueio na área auditiva. Eu destacaria também os termos retardado e mongolóide, que são muito depreciativos. O correto seria síndrome de Down.

Essa terminologia é constante no âmbito escolar?
Jussara: Tanto no escolar quanto no social. A gente tem que aprender que as mudanças precisam acontecer não só dentro das escolas, mas a sociedade tem que saber como lidar com as pessoas com necessidades especiais.

Falta informação ao professor sobre quais termos usar com os deficientes?
Jussara: Falta. A faculdade não preparou adequadamente os docentes. Na realidade, os professores que vêm de um sistema educacional de até 13 anos atrás, saíram da faculdade sem saber nada da área de educação especial. Eles não tinham nenhuma matéria a respeito. O universitário de pedagogia concluía a faculdade com aptidão para trabalhar com o aluno sem nenhum tipo de deficiência ou necessidade especial. Educação inclusiva não entrava na grade curricular. Está entrando agora, mas ainda em poucas faculdades.

Quais são os prejuízos dessa terminologia para os deficientes?
Jussara: Elas são bastante preconceituosas e estigmatizantes. Quando ouvimos “vi um deficiente”, por uma pessoa que fala de uma forma diminuída, nos sentimos estimulados a continuar não acreditando na capacidade de desenvolvimento e aprendizagem deles. A sociedade ainda vê o deficiente de uma forma menor, sem grandes potencialidades. Porém, já existe a consciência de que são pessoas que têm um déficit em alguma área, porém com possibilidade de desenvolver outras habilidades. É o caso, por exemplo, da pessoa que tem deficiência auditiva. Ela compensa o problema na capacidade de concentração.

Na sua opinião, a sociedade usa termos discriminatórios por não conhecer o real significado dessas palavras ou porque, de fato, têm a intenção de discriminar os deficientes?
Jussara: A sociedade ainda discrimina porque ela está preparada para lidar com o belo, o perfeito e o inteiro. Qualquer pessoa que fuja do conceito tido como ideal pela mídia, como quem é gordinho ou baixinho, acaba sendo discriminada. Infelizmente, a sociedade ainda não aprendeu a conviver com as diferenças de cada um.

A sra. acha que falta investimento na reciclagem de professores?
Jussara: Dentro do âmbito estadual não. Hoje, o professor da rede pública do Estado é mais acomodado e não quer fazer cursos de reciclagem. No entanto, capacitação existe e as escolas estão sendo equipadas. Infelizmente, muitos profissionais não querem estudar.

Qual a sua perspectiva para a educação inclusiva no Brasil?
Jussara: A proposta de inclusão, segundo os estudiosos, vai durar 20 anos. E a gente tem uma ansiedade muito grande em fazer com que ela aconteça hoje. Muita gente diz que a inclusão não vai dar certo porque os professores e as escolas não estão preparados. Na realidade, ela é um processo, que está acontecendo. Estão surgindo novas técnicas de trabalho com os alunos com necessidades especiais e cada vez mais as pessoas estão sendo obrigadas a aprender.

Lucien Luiz

Jussara Berno: "A sociedade precisa aprender a viver com as diferenças"